Artista recebeu o aviso de despejo do prédio que fica na Vila Madalena. No local será construído um edifício
Antonio Nóbrega é um brasileiro sincopado. Tenta se desviar das tantas pedras do caminho com o gingado que só nós temos. Enquanto leva a arte brasileira aos vários lugares do mundo, através de palestras e aulas-espetáculos, e ao Brasil se apresenta nos palcos, no teatro e em breve no cinema (no dia 20 de novembro, lança o filme Brincante), o artista pernambucano também corre o risco de perder seu próprio chão: é mais um brasileiro de carne e osso que luta para não ser engolido pelos gigantes de cimento e argamassa.
Bailarino, ator, professor e cantor, Nóbrega vive em São Paulo há décadas, e há 21 anos mantém, com esforço e trabalho, o Instituto Brincante, espaço que abriga apresentações de música, teatro e dança, palestras e oficinas sobre a arte brasileira. No entanto, há um mês, o artista recebeu o aviso de despejo do prédio que fica na Vila Madalena, bairro nobre paulistano. Os dois galpões de 800m² foram vendidos a uma incorporadora para a construção de um edifício. Segundo Nóbrega, o metro quadrado na região custa de R$ 6 mil a R$ 9 mil. “Eu não tenho esse dinheiro em caixa, mas há formas de consegui-lo”, garante Nóbrega, que tem 15 dias para deixar o imóvel.
“A gente, de alguma maneira, já previa isso. Como no Recife, a Vila Madalena tem sofrido com a grande especulação imobiliária”, afirma o músico. “O que o Brincante está passando é igual ao problema com a ocupação do Cais José Estelita. São espaços urbanos onde a sociedade civil não tem nenhum poder de se colocar. O capital ficou muito fácil de tomar conta de tudo”, finaliza. Ele ressalta ainda a importância que essas situações têm ao abrir a discussão do direito da sociedade de discutir a gerência dos espaços públicos.
Norteado pelos ensinamentos do escritor e dramaturgo Ariano Suassuna, Antonio Nóbrega leva o Instituto Brincante mergulhado no cerne do Movimento Armorial. “É um lugar referencial não só para São Paulo, como para o Brasil, por ser um misto de centro cultural, espaço de cursos e eventos. A nossa singularidade é termos como escopo e alicerce a cultura popular, sem visão xenofóbica, mas uma maneira de apresentar ao Brasil a cultura do Brasil”, conta. Neste centro cultural, por onde já passaram mais de 50 mil visitantes e 20 mil alunos, se apresentaram nomes como o bailarino e músico Helder Vasconcelos, o cantor Siba e o próprio Ariano.
Em entrevista ao Estado de S. Paulo, na última terça, o ex-proprietário do imóvel, César de Oliveira Alves, disse que não gostaria de ter concluído a transação, mas que precisou do dinheiro por problemas de saúde na família. No entanto, Nóbrega reclama que não foi procurado antes da conclusão da venda. Agora, o pernambucano tenta, junto à Justiça, o direito de compra do espaço. “A preferência é nossa, afinal estamos aqui há mais de duas décadas”.
Enquanto espera uma decisão da Justiça, e sem desacreditar nela, Antonio Nóbrega também conta com ajuda dos fãs e amigos. Nas redes sociais, os internautas postam apelos com a expressão “#ficabrincante”.
PROJETOS - Sem parar um só minuto, Nóbrega se divide entre as negociações sobre os galpões com projetos artísticos. Atualmete, finaliza o documentário musical Brincante, com direção de Walter Carvalho. O longa-metragem reconta o universo criado por 40 anos de pesquisas e criações do multiartista.
Na internet, Nóbrega decidiu melhor conciliar o trabalho de músico com o de dançarino e palestrante, e agora disponibilizou toda a sua obra à venda em diferentes canais digitais e, de quebra, modernizou seu site www.antonionobrega.com.br. Em breve, o artista pretende se dedicar ao blog. Uma plataforma que, segundo ele, facilitará ainda mais a disseminação da arte.
Em agosto, ele palestrar em Londres, no Congresso Internacional da Brazilian Studies Association (Brasa), que acontecerá no final de agosto. Usando a dança como caminho do pensamento, o artista vai mostrar o que faz da arte brasileira uma expressão singular.
JConline
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