“Há
várias maneiras de se cantar e fazer música brasileira. Gilberto Gil prefere
todas. Assim, ele se entende com o público. E daí, o espanto dos incautos que
não entendem (ou aceitam) a extraordinária musicalidade de Gil e o modo pelo
qual ele aprende e pode utilizar - do jeito mais pessoal - qualquer forma
musical nossa, do baião ao samba, da marcha-rancho à canção romântica”. O
parágrafo é pinçado do texto assinado por Torquato Neto (1944/1972), para a
contracapa de Louvação (1967) do álbum De estreia de Gilberto Gil.
Gil
lembra o comentário de Torquato, ao conversar, por telefone, sobre o show que
apresenta, com a Orquestra de Sopros da Pro Arte, sábado, na Praça do Carmo, em
Olinda, encerrando a programação da Mimo 2013. Será a segunda vez que ele canta
com a OSPA. Além deste show, Gil está fazendo o que gosta do palco. Ele
confessa que lhe agrada muito concertos como o de sábado pela Mimo, em espaços
abertos e gratuitos. “É muito bom estar ali, ao ar livre, o teto é o
firmamento. São geralmente lugares populares, franqueados ao público. E tem
ainda a coisa da acústica. Embora encontre teatro em que o tratamento acústico
é muito bom, no espaço aberto a acústica é facilitada, e tem ainda o prazer do
envolvimento do público e artista de forma mais natural”.
O show com a Orquestra de Sopros da Pro Arte é um projeto
feito para homenageá-lo quando completou 70 anos, em 2012. “Uma coisa deles,
que vêm homenageando compositores brasileiros. Eu aceitei participar, gosto
muito do trabalho que eles fazem. É uma coisa simples, músicos crianças e
adolescentes formando-se em música, familiarizando-se com os arranjos. O que
fica simbolizado no emprego da flauta doce, instrumento básico no ensino da
música, mas também empregam muita percussão, baseados nos vários ritmos brasileiros.
No
repertório estão composições, umas mais, outras menos conhecidas, de Gil, com
arranjos de músicos da OSPA: Beira-mar, Amor até o fim, Viramundo, Extra,
Expresso 2222, De onde vem o baião, Drão, Roda, Lunik 9, Eu vim da Bahia,
(“Sítio do pica-pau amarelo”) e Mar de Copacabana. Gilberto Gil pode ser visto
também na programação da Mimo no filme Tropicália, elogiado documentário de
Marcelo Machado que incensou na geração nascida nos anos 90 o interesse pelo
tropicalismo e pelo udigri dos anos 70. Neste segundo, a figura do carioca
Jards Macalé (cujo pai era olindense) paira soberana. Macalé se apresenta,
antes de Gilberto Gil, no mesmo palco da praça do Carmo, com a banda Let’s play
that, e apresenta uma retrospectiva de 40 anos de carreira, a contar.
Contemporâneos e comungando inquietudes assemelhadas, dificilmente os dois irão
se cantar juntos sábado: “Acho que não vai haver ese encontro porque não sei
como ele está, nos vemos poucos. Naturalmente vamos nos avistar como colegas,
somos amigos”.
CARLOS
FERNANDO -
“Gilberto baiano meu amigo do peito/em cima ou embaixo/aquele abraço, meu
nego”, os versos iniciais de Lenha no fogo, de Carlos Fernando, faixa do
primeiro álbum da série Asas da América cita Gil, que participou de duas
edições do projeto. Os dois se conheceram em abril de 1967, quando Gilberto Gil
se apresnetou pela primeira na capital pernambucana, e começava a divulgar seu
LP de estreia, Louvação, ainda em acetato. Carlos Fernando foi o cicerone de
Gilberto Gil a Caruaru, e quem lhe levou para conhecer a banda de pífano dos
Irmãos Biano. A ideia de misturar o diamante bruto da Banda de Pífano e
Caruaru, com o rubi extremamente lapidado dos Beatles foi a centelha que
acendeu a fogueira cujas labaredas se espalharam pela MPB com o nome de tropicalismo.
Gil ainda não sabia do falecimento do amigo (no dia 1º de setembro): “Ele me
apresentou a uma porção de coisas. Me apresentou a Lia, ainda mocinha, em
Itamaracá, gravou um cassete com cirandas, que mais tarde eu utilizaria em
alguns trabalhos. Me mostrou o panorama variados de coisas que há em
Pernambuco. Também me articulou com muita gente, foi por ele que conheci Naná
Vasconcelos. Nos encontramos pela última vez no Recife, naquele encontro que
celebrava os 50 anos do TPN”.
PROGRAMAÇÃO - A décima edição da Mostra
Internacional de Música de Olinda (este ano reforçada com patrocínio do
Bradesco), começou em Paraty (Rio), de 23 a 25 de agosto. A programação foi
quase idêntica á de Ouro Preto (MG), de 29 de agosto, a 1º de setembro. Em Ouro
Preto foi a segunda edição. Em Paraty, cidade histórica, de intensa
movimentação turística, os shows foram bastante concorridos. No palco
principal, sobretudo, onde se apresentaram, entre outros, o americano Herbie
Hancock (em se único show no festival), os portugueses do Madredeus, e João
Bosco, no show de 40 anos de carreira. Mas concertos de nomes menos badalados,
também levaram ótimo público à Igreja Matriz N.Sa dos Remédios, a exemplo do
alemão Stephen Micus, um mestre de vários e diversificados tipos de instrumentos,
que executa de forma sutil e minimalista. MIcus também se apresentou e Ouro
Preto.
A música normalmente atrai mais gente aos festivais, porém a Mimo tem o
diferencial dos filmes que têm a música como tema. Já é responsável pela maior
mostra do gênero no país. Em Olinda o festival vai de amanhã até sábado, também
com debates e eventos didáticos. Toda a programação gratuita, e pode ser
conferida no site: www.mimo.art.br/
José Teles
Hornal do Commercio
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