"Somos tão jovens',
que recria a juventude do compositor, tem estreia prevista para 3 de maio.
A música de Renato Russo (1960-1996) entrou na vida de
Thiago Mendonça de forma indireta, ainda na infância, na voz de cantoras como
Marina Lima (“Ainda é cedo”) e Cássia Eller (“Por enquanto”), que sua mãe
costumava ouvir em casa. O contato com a obra do músico se aprofundou quando
seu irmão mais velho, já entrando na adolescência, aprendeu a tocar violão e
guitarra com revistas de música cifradas com canções da Legião Urbana. Mesmo
naquela época, a relação com a obra do grupo era lúdica, basicamente.
— Lembro que lá em casa tinha uma fita
cassete do disco “Que país é esse?”. Mas, como só tinha 8 anos, eu ouvia muito
mais canções como “Eduardo e Mônica”, porque tinha uma levada mais divertida,
contava uma historinha de amor, chamava bicicleta de camelo, essas coisas. Não
tinha maturidade para alcançar as letras mais politizadas do Renato — lembra o
ator fluminense de 32 anos, que dá corpo e voz ao líder do Legião em “Somos tão
jovens”, de Antônio Carlos da Fontoura, longa-metragem que recria a juventude
do compositor.
Thiago amadureceu, passou pela fase de
identificação com as letras de tom desiludido e raivoso da Legião e continuou
admirando, à distância, o efeito catártico das canções nas gerações que o
sucederam. Quando o diretor de “A rainha diaba” (1973) o convidou para recriar
os anos de formação de Renato, em Brasília, o ator desengavetou o pouco de
familiaridade que guardava do músico e fez o impossível para se cercar de
fontes que pudessem fornecer elementos sobre ele.
— Eu me lancei numa busca constante de
me aproximar das pessoas, das coisas e dos lugares que eram caros ao Renato —
conta Thiago, que fez questão de dar entrevista e tirar fotos para esta
reportagem na livraria Leonardo da Vinci, no Centro, um dos endereços
preferidos do músico no Rio. — Ele era um rato de livraria.
Antes mesmo do início da pré-produção
de “Somos tão jovens”, que tem estreia prevista para 3 de maio, Thiago se
enfurnou semanas a fio no estúdio de Carlos Trilha, produtor dos últimos discos
de Renato e amigo íntimo do compositor, quando aprendeu a manejar instrumentos
musicais. Quando a produção se instalou em Brasília, três meses antes das
filmagens, Mendonça levou um violão, uma guitarra e um amplificador e
transformou seu quarto no Hotel Nacional em uma espécie de templo ao
personagem, cobrindo as paredes com fotos, pôsteres e textos que remetiam ao
universo emotivo e intelectual do jovem Renato.
— Era uma referência direta ao próprio
quarto que o Renato ocupou na casa de seus pais. No início do filme, há apenas
algumas fotos nas paredes, mas com o passar do tempo ela fica inteiramente
tomada por material iconográfico de bandas de rock estrangeiras — explica o
ator, que fez do quarto de hotel uma extensão da vida no set. — Era um lugar
onde eu não me desligava da história do Renato quando voltava das filmagens. Um
ponto agregador, onde a equipe, os consultores e os atores se encontravam para
tocar e cantar.
Domínio da voz
Auxiliado de perto por músicos que
conviveram com o líder da Legião Urbana e pela família do artista — a mãe de
Renato, Dona Carminha, e a irmã dele, Carmen Tereza, eram presenças constantes
no set —, Thiago dominou seu personagem nos mínimos detalhes, dos gestos à fala
impostada. A maior surpresa, no entanto, é o nível de aproximação da voz do
ator com a de Renato, a ponto de a produção decidir gravar as performances do
líder do Aborto Elétrico — sua primeira banda, de inspiração punk — com som
direto, ao vivo.
—Talvez meu timbre seja bem próximo ao
do Renato, em alguns momentos e tons. Sempre houve essa preocupação de buscar a
similaridade vocal, de criar um desenho da evolução da voz dele, da fase mais
aguda, na época do Aborto, até se tornar um trovador solitário, quando ela fica
mais grave — recorda o ator, que interpretou o cantor sertanejo Luciano, sem
precisar cantar, no filme “2 filhos de Francisco” (2005), de Breno Silveira. —
Mas só me senti realmente satisfeito com minha performance vocal quando filmamos
uma cena em que Renato canta “Fátima”, quando ele se apresenta pela primeira
vez como Renato Russo. A verdade é que só me dei conta do que tínhamos
alcançado quando pude assistir ao filme pela primeira vez, no fim da semana
passada.
CARLOS HELÍ DE ALMEIDA
o gLOBO
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