Que
dor profunda senti, ontem, com a confirmação da morte do cantor cearense
Belchior, um dos meus ídolos da MPB, parte inesquecível da minha juventude, um
pedaço arrancado do meu coração. Eu sou um rapaz latino-americano e como
Belchior, que tinha um canto torto, o meu verso é torto, mas tem muito amor, o
amor que brotava da sua voz inconfundível.
Fiquei engasgado. Belchior se confunde com a minha
geração. Sua voz, seu violão, o banquinho, suas canções derramando amor em cada
frase, em cada refrão. Até o seu bigode compunha um figurino bonito, dele
próprio, com aquela cara de louco, mas que de loucura só tinha o pensamento no
infinito amor, o amor que incendiou minha geração, a geração pós-jovem guarda.
Antônio Carlos Gomes Belchior Fontenelle Fernandes veio lá
de Sobral, chão abençoado do Nordeste, celeiro de poetas, cantadores, amantes
da noite, da lua, que inspira a música e embala seus feitores. Belchior foi
criado no mato, ouvindo vários cantos: o canto do aboio, o canto do vaqueiro, o
canto dos repentistas e dos emboladores. Acordava ouvindo o canto do galo. Daí,
a sua melodia ser uma mistura de tantos cantos, que aos poucos encantou o País
e depois o mundo.
Quem melhor definiu suas proezas musicais, seu talento,
foi o cantor Guilherme Arantes: “Belchior, que eu não canso de homenagear de todas
as maneiras, foi e sempre será o melhor letrista de canções transformadoras que
já existiu”. O canto torto cearense, de tantos desencontros na vida, gravou
grandes sucessos.
Curti todos em shows, discos DVDs, em todos os canais
possíveis. Velha Roupa Colorida, Apenas um Rapaz Latino-Americano e Como Nossos
Pais, esta eternizada na voz de Elis Regina. Meu ídolo foi um dos primeiros
cantores de MPB do Nordeste a conseguir destaque nacional, ainda nos anos 1970.
Cantava fazendo poesia. Estava mais angustiado que um
goleiro na hora do gol, diz uma das suas melodias. Quando você entrou em mim
como um Sol no quintal, embalou em outra canção. Outra bela poesia em forma
musical, um de seus maiores sucessos: “As velas do Mucuripe/ Vão sair para
pescar/Vou levar as minhas mágoas/Prás águas fundas do mar/Hoje a noite
namorar/Sem ter medo da saudade/Sem vontade de casar”.
Aprendi mais de filosofia escutando Belchior do que com
qualquer livro. A música dele permite um aprendizado que não é mensurado em
nota. Para mim, Belchior não morreu. Ele só terminou de dizer tudo o que
queria.
“Eu quero é que esse canto torto/Feito faca corte a carne
de vocês”. Viva Belchior! Dos grandes! Minha dor, como cantou ele, é perceber
que, apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e
vivemos.
Para encerrar, Como nossos pais, umas das melhores dele:
“Não quero lhe falar/Meu grande amor/Das coisas que
aprendi/Nos discos/Quero lhe contar como eu vivi/E tudo o que aconteceu
comigo/Viver é melhor que sonhar/Eu sei que o amor/É uma coisa boa/Mas também
sei/Que qualquer canto/É menor do que a vida/De qualquer pessoa/Por isso
cuidado, meu bem/Há perigo na esquina”.
Viva Belchior!
Como é perversa a juventude do meu coração, que só entende
o que é cruel, o que é paixão.
Por Magno Martins
Blog Nil Junior
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