Um dos ícones da literatura brasileira do último meio século, o baiano João Ubaldo Ribeiro saiu de cena, deixando uma obra sólida e um romance inacabado
A notícia da morte de João Ubaldo Ribeiro, 73 anos, pegou o mundo literário de surpresa. A saúde havia vacilado há alguns anos, mas o escritor baiano havia se restabelecido e até ironizado da situação, em crônica no jornal carioca O Globo, onde falava em enfrentar "à constrangedora situação de ir dormir vivo e acordar morto". Desta vez, não houve aviso. O imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL) se foi na madrugada de ontem, 18, vítima de uma embolia pulmonar. Ele estava em casa, no Leblon, na zona sul do Rio de Janeiro.
O corpo foi velado na sede da ABL, no Rio. Na centenária instituição, Ubaldo ocupava a cadeira 34 - e foi o autor mais expressivo deste assento, que tinha como patrono o obscuro poeta-sacerdote Sousa Caldas. Nos salões da ABL, Ubaldo circulava com o luxuoso fardão verde, bordado com ramagens de louros dourados, ladeado por escritores importantes e notáveis influentes. Quando se recolhia para escrever, preferia uma informalidade radical, da bermuda e dos chinelos - e sem vestir uma camisa, claro.
Essas duas imagens contrastantes e triviais ilustram bem o tipo de homem e artista que era João Ubaldo Ribeiro: alguém que se equilibrava sobre territórios que, em geral, exigem uma tomada de posição inequívoca. Era um escritor estabelecido, reconhecido pela crítica, pela academia e por seus pares; ao passo que construía uma obra corajosa, que não se acomodara esteticamente, nem se furtava à experimentação (diferente de uma parcela dos imortais, presos a um tradicionalismo sem brilho e anacrônico).
Era um escritor com apelo de mercado, sem que para isso tenha feito concessões ao leitor acomodado. João Ubaldo também gozava de um status que, cada vez mais, parece distante dos escritores aparecidos nas últimas duas décadas. Era um intelectual que se costumava ouvir, não apenas sobre questões literárias. Ao mesmo tempo, escrevia para jornais de todo País (ele chegou a ser colunista do Diário do Nordeste), com textos carregados de humor e leveza, como quem trata dos dramas do mundo numa mesa de bar.
Ele era casado com Berenice de Carvalho Batella Ribeiro, com quem teve dois filhos, Bento e Francisca. Tinha outras duas filhas, Emília e Manuela, de um casamento anterior.
Reconhecimento
Nascido na ilha de Itaparica (BA), em 23 de janeiro de 1941, Ubaldo formou-se em direito, na Universidade da Bahia. Contudo, nunca chegou a exercer a profissão. Como outros escritores (ou aspirantes ao ofício), acabou tomando o caminho do jornalismo. Foi repórter, chefe de reportagem e colunista do Jornal da Bahia e chegou a editor-chefe da Tribuna da Bahia. Era colunista do jornal Frankfurter Rundschau, na Alemanha, e do O Globo.
Também teve uma carreira acadêmica - era mestre em Administração Pública e Ciência Política pela Universidade da Califórnia do Sul, nos EUA -, tendo lecionado em universidades baianas.
A estreia literária aconteceu aos 21 anos, com o romance "Setembro Não Tem Sentido". O segundo veio quase uma década depois. "Sargento Getúlio" (1971) é talvez seu melhor livro, escrito numa narrativa em forma de fluxo, numa espécie de faroeste sertanejo.
A obra rendeu-lhe o primeiro prêmio Jabuti da carreira, em 1972, e foi adaptado para os cinemas por Hermanno Penna, com o ator Lima Duarte no papel título.
Com seu romance histórico sobre a ocupação portuguesa, "Viva o Povo Brasileiro" (1984), João Ubaldo Ribeiro ganhou seu segundo Jabuti. O livro é um dos mais famosos de sua bibliografia.
Seu romance mais recente é "O Albatroz Azul", em que os temas da morte e da velhice marcavam a narrativa. Além de seus textos para jornais e revistas, o escritor trabalhava em um novo romance, há cerca de um ano. A família não divulgou o tema, nem detalhes do enredo.
Com informações das agências Folhapress, Estado e Globo
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