Veja mapa com a localização dos monumentos construídos pelo artista
"Completar 90 anos não é brincadeira", confessa o próprio Abelardo da Hora, que comemora nove décadas de vida nesta quinta, dia 31 de julho de 2014. Além de um talento genial para as artes, a sensibilidade social e a generosidade sempre estiveram também entre suas principais qualidades: "Eu fui mestre da nata dos artistas de Pernambuco. Esses artistas todos me tratam como se fossem meus filhos, pois eu ensinei a todos de graça. Fico feliz de ter dado essa contribuição à cultura pernambucana."
Veja mapa dos monumentos no fim desta página
Seu aniversário já começou a ser celebrado. As homenagens já se multiplicam desde a semana passada, quando ele foi convidado para um tributo na União Brasileira dos Escritores. "Sou um poeta bissexto", lembra Abelardo, cuja célebre série de gravuras Meninos do Recife foi lançada em 1962 junto com um poema homônimo escrito pelo próprio artista.
"Eu acho que já passei da conta", admite o artista a respeito de sua idade: "Como diz o povo, eu já comi do pão que o diabo amassou. Já experimentei muita coisa na vida, muita coisa boa e maravilhosa, mas muita coisa ruim. A pior coisa que aconteceu comigo, e na vida do Brasil todo, foi o golpe militar, pois eu estava com um cargo de secretário de educação e cultura. Sofri muito, fui perseguido e fiquei preso."
A comemoração oficial do aniversário de Abelardo da Hora será feita com sua própria arte. Na Arena Pernambuco, às 19h, é inaugurado o monumento O artilheiro, em homenagem aos jogadores de futebol. Com 12,5 metros de altura e peso de 1,5 tonelada, a nova escultura é uma de suas maiores obras e ficará erguida em sua cidade natal, São Lourenço da Mata, onde fica o estádio.
Ele também é o homenageado do 4º Congresso Internacional de Arte-Educação, que termina nesta sexta na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde uma exposição do artista está em cartaz no hall Centro de Artes e Comunicação (CAC). Durante este ano, obras de Abelardo ainda ilustrarão todo o material produzido pelo Recife Convention & Visitors Bureau, entidade responsável pela inclusão da cidade nos roteiros turísticos nacionais e internacionais.
Sobre as tantas comemorações, Abelardo da Hora desabafa: "É uma trabalheira tão grande que eu nunca mais quero fazer 90 anos."
O ARTILHEIRO, 2014 (texto crítico de Júlio Cavani):
Apesar de Abelardo da Hora ter produzido poucas obras sobre esportes, O artilheiro está plenamente integrada à sua produção poética. No Brasil, afinal, o futebol é praticamente uma manifestação cultural popular, uma verdadeira arte. Entre as estátuas já esculpidas pelo artista, esta é uma das menos estáticas. Como no seu monumento ao frevo (Rua da Aurora), o corpo do personagem aparece em movimento, contorcido, enérgico, com a garra de quem chuta para o gol. Aos 90 anos, o escultor continua brilhante, atento aos mínimos detalhes, como a posição do rosto do jogador que parece olhar diretamente para sua meta, apoiado em apenas uma perna, de ponta de pé. Predomina o expressionismo e o realismo não está presente de forma naturalista (não há dedos nas mãos, por exemplo), mas a coerência anatômica permanece fundamental para a harmonia do gesto. Com perfeito equilíbrio, a peça é ainda um desafio à gravidade. É uma jogada de craque eternizada em bronze.
MENINOS DO RECIFE (Abelardo da Hora, 1962)
Meninos do Recife
São habitantes anônimos
Dessa cidade alagada,
De limo e pedra formada
Sob marés.
Submersa.
Em lodo, em lama inconscienste,
Consubstanciada.
Vasto poço de afogados,
Habitação de mitos e de fantasmas.
Imenso pasto de pestes.
Cidade desabrigada.
Habitantes desse pântano,
Sem escrituras, sem títulos.
Submetidos ao ócio
que gera a fome e o vício
E um calendário implacável
De misérias e imprevistos.
São apenas habitantes
Dessa cidade alagada,
Atirados sobre a lama,
Sob as marés da desgraça.
MAPA DOS MONUMENTOS DE ABELARDO DA HORA:
Júlio Cavani - Diario de Pernambuco
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