
Um registro dos 20 e poucos anos, em ensaio para o lançamento do disco, no Rio de Janeiro. Foto: Arquivo pessoal
A partir desta terça-feira, vão se encontrar em estúdio para recordar os acordes das faixas de Baque solto(1983), o marco inicial e nada bem-sucedido da carreira da dupla, que estarão no repertório comemorativo do show homônimo, no próximo sábado, no Baile Perfumado.
Quando Baque solto foi gravado, os dois eram jovens adultos recém-chegados ao Rio de Janeiro - sem grana, sem emprego e sem “colo de mãe”, como Lenine costuma falar. Mas com muita garra e vontade de fazer música. As músicas faziam parte do show Trem fantasma, que cumpriu temporada no Teatro Ipanema, em 1982.

Em 2013, já com cabelos brancos e sem os apertos profissionais da época e envoltos pelo clima de nostalgia provocado pela junção das pessoas envolvidas no projeto e pelas recordações dos louváveis 20 e poucos anos, os amigos relembram a amizade de décadas.
Serviço
Comemoração de 30 anos de Baque solto no Baile Perfumado
Quando: Sábado (14), às 23h30 (a casa abre às 22h)
Onde: Baile Perfumado (Rua Carlos Gomes, 390, Prado)
Ingressos: Pista: R$ 80 e R$ 40 (meia). Mesa para 4pessoas: R$ 500
Informações: 3033-4747
“Você tem irmãos de sangue e os que escolhe. Lula é o irmão que escolhi”
Quando e como você conheceu Lula Queiroga?
Rapaz, tenho a impressão de que foi em um daqueles festivais de música que a gente frequentava, lá pelos finais de 1970. Se eu chutar, é capaz de meu parceiro, que tem memória melhor, me fazer. Eu tinha lá pros 19, 20 anos.
Tinha Milton, que era um farol muito poderoso, uma novidade incontestável para todo mundo. Mas também Gonzaguinha, que a gente ouviu em demasia. Além disso, tinha a cultura popular, de que estamos impregnados. Não tenho a mínima ideia dos lugares. A gente costumava beber muito. Qualquer pretexto servia para se encontrar, tocar violão e esconder as garrafas de cerveja, que eram muitas. (risos)
Como foram os primeiros momentos no Rio de Janeiro?
Eu fui um pouco antes. Foram todas as dificuldades que você possa imaginar. A vida sorriu amarelo naquela época. O som da gente não tinha nicho nem teve eco, a gente fazia um tipo de música que não teve resposta. Mas a gente foi cabeça dura

A gente foi namorador sim. Quem não é? Na verdade, para mim, a música foi um libertador. Eu tinha uma incapacidade de lidar não só com o sexo oposto, mas com a humanidade. A música facilitava tudo.
Como foi a turnê de Baque solto? É verdade que Patrícia Pillar foi camareira? O que mais tinha de curioso no projeto?
Não sei quem inventou essa história de Patrícia. Não lembro dela como camareira, mas lembro de ela levar flores e arrumar o camarim, durante a temporada no Teatro Ipanema. João Mário, que era o produtor, no primeiro dia fez uma turnê com o grupo Céu da Boca. Então tivemos ajuda do Menescal (Roberto), queridíssimo, na época diretor da Polygram. Luiz Roberto Bertrand foi produtor, um anjo da guarda para mim e para Lula. Temos um débito histórico com ele. Ele não está mais entre nós, mas fica aqui o eterno agradecimento.
Qual a parceria com ele de que você mais gosta?
Tu vais perguntar ao pai qual o filho mais bonito, é? Cada música tem uma peculiaridade. Só quem criou sabe, sacou? Com Lula, tenho muita coisa juntos. É difícil. Não poderia eleger.
Como é o processo de composição de vocês?
Cada vez que tenho desejo de fazer um disco, ligo para meus pares, meus irmãos. A gente compõe conversando assuntos interessantes. Tem mecânica não. Tanto eu como Lula, a gente trabalha com letra e música. Lula é um puta cronista. Ultimamente, nossas músicas têm sido através de textos dele, ou músicas dele. Tem essa promiscuidade sadia.
Como e com que frequência vocês se falam?
É meio de lua. Durante muito tempo, fazendo as turnês, eu ligava a cobrar, dizendo que tava ligando do futuro. Às vezes, eram 3h, 4h da manhã. Só amigo muito íntimo que faz uma coisa dessas. Mas não lembro a última vez que fiz isso… Temos muita coisa em comum. Somos muito irmãos e passamos muitas coisas juntos. Você tem irmãos de sangue e os que escolhe. Lula é o irmão que escolhi.
Entevista // Lula Queiroga
"Todo mundo ficava meio hipnotizado com Lenine"
Quando e como você conheceu Lenine? De cara, a música já foi algo que os uniu?
A gente se cruzava em alguns lugares, shows, tínhamos amigos em comum. Lenine tinha montado uma banda chamada Flor de Cactus com Zeh Rocha, Caca Barreto (da Muzak), Mario Lobo. O front man, o crooner, da Flor de Cactus era Lenine. Todo mundo ficava meio hipnotizado com o cara. Eu tinha 18, 19 anos. .

Meus points eram mais em Olinda, Bar Atlântico, Ecológico, Centro Luiz Freire, casa de amigos músicos, artistas. Mas minha casa era uma festa. Organizei festivais. Ouvia muita coisa, principalmente o que tava rolando de bom daqui do Nordeste. Alceu, Zé Ramalho, Fagner, Belchior, Geraldo Azevedo. Além do disco do Ave Sangria, Lula Côrtes.
Como foram os primeiros momentos no Rio de Janeiro?
Lenine foi primeiro. Teve no Recife no verão e voltou pro Rio com um filho pra nascer (hoje, o incrivel João Cavalcanti, do Casuarina). Eu cheguei quase um ano depois. Tava todo mundo na batalha, dinheiro curto. A vida foi entrelaçando nossos caminhos. Mas a gente sempre teve uma identificação muito grande. Musical e de alma.
Como eram as relações de vocês com as mulheres?
É claro que com o grau de exposição, shows, canjas, agito a gente era muito assediado. Era natural chegar no camarim depois do show e estar cheio de gatinhas amigas ou não. Mas a gente já era comprometido, apaixonado. Aliás, meu filho Rafael Queiroga nasceu um dia antes de entrarmos em estúdio. E nossas mulheres eram as produtoras. No way.
Como foi a turnê de Baque solto? É verdade que Patrícia Pillar foi camareira? O que mais tinha de curioso no projeto?
Na verdade, fizemos temporadas no Rio. Isso de Patrícia não é verdade. Ela levava flores pro camarim, dava um trato. Era tudo muito carinhoso. Ela era namorada do Zé Renato, do Boca Livre. Magrinha dos olhos brilhantes. Uma luz. Antes do show começar, a gente levava microfones pro camarim, juntava a banda toda e começava a cantar e batucar. O som saía pra plateia. Ninguém entendia o que era aquilo. Era um descarrego. Não tinha negócio de prece. Às vezes, demorava minutos e então a gente entrava no palco. A galera adorava. Será que vamos repetir isso no dia 14, no Baile Perfumado?
Qual a parceria com ele de que você mais gosta?
Gosto muito de A ponte. É uma música ícone em que cantamos o Recife por outro prisma. Ganhamos o Prêmio Sharp em 1998. Ganhamos de Gil e de Milton. Outra que me amarro é a A rede. Enfim, gosto de todas.
Como é o processo de composição de vocês?
Completamente irregular. Presencial, quando a gente está junto e por acaso começa a tocar alguma coisa. Também tem o processo quando a gente começa a tocar a partir de uma batucada, uma história. Pode ser mandando letras. Já teve um dia por secretária eletrônica. E também as encomendas.
Como e com que frequência vocês se falam?
A gente se fala muito por telefone, mas, quando se encontra, passa um dia, dois. No primeiro dia deste ano, ficamos até o outro dia de manhã.
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