Depois que almocei coalhada,
Fui pra rua e a meninada
Tava jogando pião.
Eu gostei da diversão,
Na terça mãe foi pra a feira,
Trouxe pra mim uma ponteira
E eu inventei pro meu uso
Um bico de parafuso
Num pião de goiabeira.
Pelo meu sertão querido,
Para ser bem recebido,
Chegando em uma moagem,
Não tenha nunca a coragem
De espantar um boi deitado;
Trabalhou, tá enfadado,
Descansando e remoendo
Não faça nada sabendo
Que está fazendo errado.
Põe detrás do torriame;
O cortiço solta enxame
Num zunido barulhento.
O monte fica cinzento,
A sombra se distancia,
O gavião prende a jia,
Das unhas faz uma algema,
Murcha a folha da jurema
Depois da morte do dia.
Só uma banda de sol.
A sombra do arrebol
Vai ficando desmaiada.
A água fica parada,
Cessa toda ventania,
O passaredo em folia
Começa a entristecer,
Vendo o mundo escurecer
Depois da morte do dia.
As folhas, devagarinho,
Fazendo o último carinho
Ao dia que vai morrendo.
Farpas de luz se estendendo
Por cima da serrania;
Toca o sino Ave-Maria,
Nessa hora cai sereno
Dos olhos do Nazareno,
Depois da morte do dia.
Sugando a seiva da terra,
O sol se esconde na serra,
O mundo escuro se torna.
Numa tacha de tiborna
Um barrão a tromba enfia;
Estraga a mercadoria
Que o dono estava guardando,
Bebe, vira e sai roncando
Depois da morte do dia.
Do sol a última centelha
E vai pousar numa ovelha,
Que pasta em frente à fazenda.
Uma velha que faz renda,
Pára a almofada e enfia
Um alfinete que guia
Os bilros e se levanta
E vai temperar a janta
Depois da morte do dia.
Onde houve uma senzala,
Se escuta gemido e fala
De alguém que procura amigo.
Talvez, pagando um castigo
Dos malfeitos que fazia,
Vem sofrer onde vivia
Com mil pecados nos ombros;
Ser fantasma ou mal-assombros
Depois da morte do dia.
A terra ficando escura,
Baixando a temperatura
Dos raios crepusculares.
Aumentam mais os pesares
Pra quem é cego de guia,
Passando a mão na bacia,
Não ganhou, nem se aperreia;
Reza e vai dormir sem ceia
Depois da morte do dia.
Numa tarde ensolarada;
Fica a serra ensangüentada,
A noite sofre um aborto.
Já nasce o escuro morto,
Em trevas se extasia,
O pássaro ferreiro pia
E a sua marreta empunha,
Começa batendo a cunha
Depois da morte do dia.
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