quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Poesia: "Ocaso", um poema de Rogaciano Leite

Resultado de imagem para POETA ROGACIANO LEITE

OCASO

A tarde vai seguindo o enterro do crepúsculo...
O horizonte vermelho – ensanguentado músculo –
Numa púrpura embebe as lágrimas do sol!
O ventre da amplidão de nuvens está grávido
E o sol mesmo a tombar inda num gesto impávido
Deixa uns pentes de luz nas tranças do arrebol!

O mundo é um pedestal de sólida pirâmide
Que a cúpula do céu – desmesurada clâmide –
Abriga nossa concha enorme do infinito!
A Vésper já reluz na abóbada simbólica
E a terra concentrada em confissão bucólica
Parece erguer a Deus o coração contrito!

A noite é a exalação perene de um turíbulo...
Como o eunuco fugindo à ideia do prostíbulo
Nos confins do planalto o vento se suicida!
As sombras se confundem místicas e plácidas
E as flores estremecem tímidas e flácidas
Sobre o seios aromal da noite adormecida!...

O poeta lança o olhar ao mundo melancólico,
E a pérola do sonho – ergástulo simbólico –
Rebrilha em sua fronte pródiga de luz!
A mão trêmula escreve... o cérebro é um atlântico...
A ideia é branca estrela... o ritmo é um doce cântico
E a nau da inspiração em cismas o conduz!...

O verso é o batelão singrando o abismo frígido...
A rima é frágil vela aberta ao vento rígido,
Afrontando a impiedade e a fúria de Nereus...
A crença no Trabalho é a bússola poética...
O ideal é o mastro... a flâmula é a estética...
O Mar é a Natureza... e o porto imenso – é Deus!

Rogaciano Leite
Fortaleza, 1948

Poema extraído do livro “Carne e Alma” de Rogaciano Leite


CANTIGAS E CANTOS

Nenhum comentário:

Postar um comentário