Acho tudo aquilo muito bonito, fora do comum. Sou baiana, a primeira vez que vi quase morri. Não podia entender que chegasse com essa beleza toda. É lindo ver que tanto faz o luxo quando a miséria, eles sempre arrebentam. Quando Joãozinho 30 veio com lixo, farrapo, fez o melhor desfile. Eu sou pobre, então a gente gosta de luxo. É como ele dizia: ‘pobre gosta de luxo, quem gosta de pobreza é intelectual’. A Mangueira, coitadinha, é de tradição, meio pobre. Coitadinha, não. É deusa, primeiro lugar. Só pelos compositores já vale: Cartola, Nelson Cavaquinho.
Você não se considera intelectual?
Eu sou intelectual? Sou não, mas não sou mesmo. Eu sou é abelhuda. Gosto de ouvir, ler, me interessar, entender. Não sou intelectual. Sou puro instinto. Tenho garra, hein? Sou nada intelectual. Meu irmão (Caetano) que é.
Você começou a carreira, há 50 anos, com Carcará. O texto ainda se faz atual?
Porque é. E só olhar o Brasil. Continuamos com miséria, seca, fome, sem educação, sem saúde, miseráveis, excluídos.
No Prêmio da Música Brasileira, o pernambucano Johnny Hooker cantou para você. O que achou?
Um espetáculo. Olha, o que eu me diverti ali. Fiquei muito emocionada. Adorei ele contracenando com Alcione. Muito bom, está de parabéns. Tudo ali foi emocionante, sincero. Caetano emocionado. Foi tudo lindo, os atores, Renata (Sorrah), (Leticia) Sabatella. Foi tudo lindo. A Mônica Salmaso. Ele está aprovadíssimo, mas não precisa da minha aprovação nem de ninguém. Só a dele mesmo e de Deus.
Você já disse ter pena do Brasil. O sentimento mudou?
Eu tenho muita pena do Brasil. Querem fazer o foco do Brasil com algo falso. Gosto do Brasil de dentro, a Amazônia, a firmeza do sertanejo, nobre. Gosto da sabedoria do homem do mar, da alegria do povo, musicalidade, sensualidade, compreensão de que precisa distrair, brincar, que a vida é dura para todo mundo, mas precisa brincar. Quando me vêm disputando negócio de tantos mil no banco, não tem nada a ver com o Brasil. Brasil é natureza. Gosto do Brasil de dentro, sentido, suingado, real, sem vergonha.
Como você enxerga o Brasil hoje?
Difícil, triste e muito complicado, mas não é de agora. Se não educa, só piora. Ontem, ouvi “educação é cara. Experimenta a ignorância”. O Brasil ainda nem saiu da ignorância. Já está doutorado em ignorância. As escolas precisam melhorar, ter prioridade. Em primeiro lugar, aprender, comer melhor, dormir melhor, trabalhar melhor. Sabe ler, escolher. Agora interessa que se saiba? Não vem me enganar, que não gosto. Quero o Brasil fulgurante. A gente é diferente. Por que tem que ser igual?
O que acha da discussão sobre o retorno da ditadura? Você tem receio de que isso realmente possa ocorrer?
Isso é negócio de boquinha miúda, de partidinho de Brasília. Não falo sobre isso. Sou cantora, minha voz quem me deu foi deus. Não gasto com política.
Confira o roteiro do show
Ato 1
1. Eterno em mim (Caetano Veloso, 1996)
2. Dona do dom (Chico César, 2001)
* Texto de autoria de Maria Bethânia
3. Gita (Raul Seixas e Paulo Coelho, 1974)
4. A tua presença morena (Caetano Veloso, 1971)
5. Nossos momentos (Caetano Veloso, 1982)
* Texto de autoria de Clarice Lispector
6. Começaria tudo outra vez (Gonzaguinha, 1976)
7. Gostoso demais (Dominguinhos e Nando Cordel, 1986)
8. Bela mocidade (Donato Alves e Francisco Naiva, 1997)
9. Alegria (Arnaldo Antunes, 1995)
10. Voz de mágoa (Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro, 2015)
11. Dindi (Antonio Carlos Jobim e Aloysio de Oliveira, 1959)
12. Você não sabe (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1983)
13. Tatuagem (Chico Buarque e Ruy Guerra, 1973)
14. Meu amor é marinheiro (Alan Oulman sobre versos de Manuel Alegre, 1974)
15. Todos os lugares (Sueli Costa e Tite de Lemos, 1996)
* Texto Depois de uma tarde..., de Clarice Lispector (1920 - 1977)
16. Rosa dos ventos (Chico Buarque, 1971)
Interlúdio
17. Até o fim (Chico Buarque, 1978)
18. O quereres (Caetano Veloso, 1984)
19. Qui nem jiló (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, 1950)
20. Pisa na fulô (João do Vale, Silveira Júnior e Ernesto Pires, 1957) - Instrumental banda
Ato 2
21. Tudo de novo (Caetano Veloso, 1978)
22. Doce (Roque Ferreira, 2008)
23. Oração de Mãe Menininha (Dorival Caymmi, 1972)
24. Eu e água (Caetano Veloso, 1988)
25. Agradecer e abraçar (Gerônimo e Vevé Calazans, 1999)
26. Vento de lá e Imbelezô eu (Roque Ferreira, 2007)
27. Folia de Reis (Roque Ferreira, 2014)
28. Mãe Maria (Custódio Mesquita e David Nasser, 1943)
* Texto Câmara de ecos, de Waly Salomão (1943 - 2003)
29. Eu, a viola e Deus (Rolando Boldrin, 1979)
30. Criação (Chico Lobo, 1996)
31. Casa de caboclo (Roque Ferreira e Paulo Dafilin, 2014)
* Texto Candeeiro, de Carmen L. Oliveira
32. Alguma voz (Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro, 2014)
* Maracanandé (canto tupi) - na voz em off de Márcia Siqueira
35. Xavante (Chico César, 2014)
36. Povos do Brasil (Leandro Fregonesi, 2014)
37. Motriz (Caetano Veloso, 1983)
* Texto Prece, de Clarice Lispector (1920 - 1977)
38. Viver na fazenda (Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro, 2015)
39. Eu te desejo amor (Que reste-t-il de nos amours?) (Charles Trenet e Léo Chauliac, 1942, em
versão de Nelson Motta, 2015)
* Texto Sou eu mesmo o trocado, de Fernando Pessoa (1888 - 1935)
40. Non, je ne regrette rien (Charles Dumont e Michael Vaucaire, 1956)
41. Silêncio (Flávia Wenceslau, 2015)
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