Havia um vaqueiro chamado Leonídio, que com a experiência de rastrear gado nas ‘mangas’(mata aonde criava-se reses soltas), passou a rastrear cangaceiros na caatinga. Trabalhou para o Zé Rufino e Odilon Flor, dois comandantes de volantes.
Prestando seus serviços ao Sargento Odilon Flor, prestou-lhe um grande ‘favor’ quando cortou as cabeças dos cangaceiro. Segue a narração do próprio de como praticou o ato tétrico e depois suas ‘consequências’:
- Era dia de são João, às nove horas da noite. Nós demos um combate na fazenda Gararu, em Sergipe. Chovia bala, depois silêncio. Os bandidos tinham ido embora. Procuramos pelos cantos para ver se tinha ferido. O combate tinha sido tão cerrado que não tinha dado tempo de ninguém sair carregando baleado. Encontramos três cangaceiros mortos: Manoel Moreno, a mulher dele Áurea e Gorgulho. Quando foi de manhã, o sargento Odilon juntou a tropa e disse:
- Vamos cortar as cabeças dos defuntos.
Mas ninguém quis ir. Não quiseram ir porque, você já sabe, cortar o pescoço de uma pessoa é preciso que a pessoa também tenha a cara dura, porque se na for, não corta não.
Então ele virou-se para mim e disse: nego, vem cá, apanha aqui este facão e vá onde ta os cangaceiros, corte a cabeça e traga. Então eu fui e respondi pra ele: sargento, o senhor já mandou todo mundo; nenhum quis ir, só eu é que posso cortar? O senhor podia ir, porque o senhor tem mais costume do que eu. Ele então disse: eu quero é que você corte.
Aí eu apanhei o facão e fui. Quando eu peguei no cabelo do cabra, balancei, fechei a cara pro lado assim e sentei o facão, pá-pá, cortei, e joguei pra lá; peguei a mulher, cortei a cabeça da mulher. Peguei no outro cabra, cortei também a cabeça. Peguei todos os três, levei: Pronto, chefe, ta aqui.
Depois de uns dias, eu senti assim um remorso. De vez em quando, à noite quando eu dormia, sonhando com Manoel Moreno, um pouco assim de nervoso comigo, e coisa. E ele me apareceu um dia, me pegou dormindo. Pela abertura da rede e veio com um punhal em cima de mim; eu então pelejei, não pude fazer nada, gritei: cabra mata o homem, cabra, me dá as armas, cabra, até que dentro do quarto ( eu estava deitado perto da rede de uma criança, meu filho que hoje está em são Paulo), então eu tranquei os pés, a mulher levantou-se, tirou o menino da rede e ficou de lado quando eu ajuntei, pensando que o cabra estava me sangrando.
Levei a rede de uma vez só, agarrei-me nela, pensando que fosse o bandido, levei uma pancada na cabeça, (bati com a cabeça na parede) aí foi que me acordei, cansado, sufocado, sem fôlego, com o aperto que o cabra me deu. Bom, aí eu fiquei, coisa e tal e disse ao sargento Odilon: sargento, eu to me me vendo aperreado com Manoel moreno. Ele então disse: Você vai comigo daqui uns dias na casa de Pedrinho. Então eu fui. Cheguei lá, o Pedrinho fez lá um remédio pra mim e perguntou como era. Eu disse então os sintomas e depois de uns dias foi desaparecendo. Odilon me ensinou um defumador, umas coisas que o Pedrinho ensinou a ele e mandou eu tomar este defumador e com isto desapareceu. Não vieram mais me aperrear.
Depois da noite na rede a alma de Manoel Moreno tornou a aparecer; e aparecia com os braços estendidos, as mão para cima, pedindo:
Leonídio, cadê minha cabeça que você cortou?
“Referencial teórico: Soares, Paulo. Gil. Vida paixão e mortes de Corisco, o Diabo Louro.”
Fotos: não havia referência sobre quem capturou as fotografias.
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