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Esse blog tem como objetivo difundir a Música Popular Brasileira em geral, seja ela qual for: a música do Sul, a musica do Cariri, a Pajeuzeira ou mesmo outros ritmos de regiões diferenciadas. Nasci no Sertão do Pajeú, lugar onde a poesia jorra com muita facilidade e que os Poetas do Repente cospem versos com uma precisão incrível. Sempre tive esta curiosidade de fazer postagens e construir um blog. Aliás, criar um blog é simples e rápido, mas, o difícil mesmo é mantê-lo vivo e pulsante. Uma tarefa difícil e tem que ser feita com muita dedicação e precisão, sei que às vezes agradamos a uns e desagradamos a outros; também pudera, não somos perfeitos e isso acontece em todas as áreas e campos de trabalho. E para que o blog aconteça, tenho que desafiar o meu tempo e fazer propagar até aqueles que acessam e fazem aquisições de temas no gênero da música, da poesia e outros segmentos da cultura brasileira. Não tenho a experiência de um Blogueiro profissional, mas, como se diz: “Experiência só se conquista com tempo, perseverança e dedicação”. É isso aí, espero que curtam esse espaço que faço com exclusividade para vocês.


Obs.: Do lado direito do seu monitor adicionei uma rádio (Cantigas e Cantos) com a finalidade de que você leia e ao mesmo tempo ouça uma seleção musical exclusivamente feita por mim. Também inserí fotos Antigas da Capital da Poesia (S. José do Egito), fotos retiradas do Baú do Jornalista Marcos Cirano.


Texto: Gilberto Lopes

Criador do Blog.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Memória: Ralph Della Cava lança reedição de clássico sobre Padre Cícero

Pesquisador fala sobre o lado político do líder religioso e a polêmica em torno de seu suposto milagre

Romeiros devotos de Padre Cícero em procissão em Juazeiro do Norte, no Ceará
Foto: Divulgação

 RIO — Oitenta anos depois da morte do padre Cícero Romão Batista (1844-1934), milhões de pessoas continuam a celebrá-lo em romarias à cidade cearense de Juazeiro do Norte, onde ele foi eleito prefeito e deputado federal, envolveu-se em alianças e disputas com coronéis locais e teve a excomunhão decretada pela Igreja por alegar ser autor de um milagre. O fascínio duradouro em torno da figura de Cìcero é acompanhado de perto há cinco décadas pelo americano Ralph Della Cava, autor de um dos principais estudos sobre a trajetória do religioso, “Milagre em Joaseiro”, lançado em 1977 e reeditado este ano pela Companhia das Letras (em tradução de Maria Yedda Linhares).
No início dos anos 1960, quando era estudante de Ciências Sociais na Universidade Columbia, Della Cava se mudou para Juazeiro do Norte, com a mulher e os dois filhos (a mais nova nasceu em Fortaleza), para pesquisar a vida de Cìcero. Teve acesso a documentos até então inéditos do arquivo do religioso e entrevistou dezenas de moradores. Hoje um decano dos estudos latino-americanos em Columbia, Della Cava analisa nesta entrevista a atuação política de Cícero, que agia não com a brutalidade de um “típico coronel do interior”, e sim com o tino conciliador de um “político mineiro”, ironiza. Fala ainda sobre a polêmica em torno da excomunhão de Cícero, que até hoje leva fiéis a pedirem sua reabilitação ao Vaticano, e sobre a relação entre Juazeiro do Norte e Canudos.

Quatro décadas depois da primeira edição de "Milagre em Joaseiro", que controvérsias ainda existem em torno de Padre Cícero?

A principal questão em aberto é se o Vaticano um dia vai “reabilitar” integralmente Padre Cícero. Um movimento nesse sentido começou em 2004, com apoio dos fiéis do Cariri e do bispo do Crato. O que está em jogo é a anulação de uma série de decretos emitidos pelo Santo Ofício ao longo da vida do padre, incluindo a ordem de excomunhão, nunca executada. Talvez Padre Cícero não seja hoje tão controverso quanto em vida — quando a Igreja condenou como falso seu alegado “milagre” da hóstia transformada em sangue de Cristo e ele foi visto, erroneamente, como o comandante das forças do interior que derrubaram o governo “salvacionista” de Franco Rabelo no Ceará. Seja como for, como explicar que, 80 anos depois de sua morte, cerca de 2 milhões de peregrinos continuem a visitar a "Cidade Santa" de Joaseiro todo ano? Sociólogos podem argumentar que a pobreza leva as pessoas a buscar alívio em santos e milagreiros. Secularistas podem desdenhar disso como turismo religioso e fé mal aplicada.

Que tipo de figura política foi Padre Cícero? E o que a trajetória dele diz sobre a política brasileira?

Padre Cícero foi uma figura política apesar de si mesmo. Foram a sociedade brasileira da época e a imprensa sensacionalista que o projetaram como um proeminente e poderoso ator político, coisa que ele definitivamente não era. Seus "atos políticos" — como a defesa das minas de cobre locais, cujo lucro poderia sustentar uma diocese sediada em Joaseiro — tinham como objetivo conquistar a simpatia do Vaticano e o restabelecimento de seu direito de pregar, ouvir confissões e celebrar missas. E, longe de ser o "típico" coronel do interior, protegido por lacaios armados, ele atuava como um conciliador nas disputas entre os coronéis do Cariri. Se voltasse ao Brasil hoje, ele provavelmente desfrutaria da companhia dos políticos mineiros, também reputados como conciliadores. E aos membros do Congresso poderia dar um de seus conhecidos conselhos: "Os que roubaram, não roubam mais!".

O ano de 2014 marca o centenário de dois eventos cruciais na trajetória de Cícero: a morte de Maria de Araújo, a beata que protagonizou o suposto milagre, e a Sedição de Juazeiro, quando ele colaborou com a derrubada do governador cearense Franco Rebelo. Como esses eventos moldaram a imagem que temos hoje dele?

Sem Maria de Araújo o milagre nunca teria ocorrido. E sem sua crença nele, a integridade de Padre Cícero, que compartilhava dessa crença, teria sido destruída. Os dois se mantiveram firmes diante das tribulações que as autoridades da Igreja lhe impuseram. A “revolução de 1914” — a derrota de Franco Rabelo, os sonhos esmagados da incipiente classe média de Fortaleza, e a parcial restauração da velha oligarquia dos Accioli — foi rotulada pelos adversários como uma "sedição" e Padre Cícero, como seu malévolo arquiteto. Esse episódio consolidou a imagem de uma elite urbana e educada do litoral em oposição aos coronéis retrógrados do interior e seus jagunços — a imagem de duas sociedades apartadas, sendo que a segunda merecia ser destruída. Esse pensamento alimentou o trabalho de muitos autores que escreveram sobre Joaseiro desde 1914. A melhor expressão desse dualismo entre moderno e arcaico, de uma sociedade branca que se crê superior a uma sociedade mestiça, está em “Os sertões”, de Euclides da Cunha, embora uma leitura cuidadosa revele que Euclides tinha reservas quanto a esse dualismo.

Em um ensaio antigo, você escreve que Canudos e Juazeiro do Norte desafiam a visão "dualista" do Brasil como uma oposição entre centros urbanos "modernos" no litoral e uma sociedade rural "arcaica". Quais são as relações entre esses dois casos?

Canudos foi a destruição das promessas da República para o futuro da nação. Joaseiro foi o exato oposto: a reunião, ainda que sob outra bandeira, dos mesmos pobres e destituídos que o Exército massacrou no sertão da Bahia. Canudos e Joaseiro só podem ser “explicados” no contexto da história brasileira e no contexto internacional da Igreja Católica, nas disputas regionais por poder político e nos rumos sempre instáveis do mercado internacional. Antonio Conselheiro e Padre Cìcero não eram fanáticos, nem aberrações, nem charlatões. Pelo contrário, ambos a princípio assumiram papéis legitimados pela sociedade brasileira e pela Igreja Católica. Mas quando Estado e Igreja perceberam que sua autoridade podia ser questionada, decidiram dar uma lição a Conselheiro e a Cícero. O primeiro teve o corpo exumado, a cabeça decapitada e a reputação poluída até ser reabilitada por historiadores décadas depois. O segundo perdeu os direitos eclesiásticos, foi ameaçado com a excomunhão, por Roma, e com a destruição de Joaseiro, por Franco Rabelo. Talvez o maior "milagre" do Padim tenha sido a sobrevivência de Joaseiro, que hoje é a segunda cidade do Ceará em população, renda, educação, hospitais e comércio.

Qual foi a importância do período vivido em Juazeiro do Norte para sua compreensão da cidade e de Padre Cícero?

Só posso agradecer por ter chegado a Joaseiro antes de a novela das oito consumir cada segundo do tempo livre de seus habitantes. Na época, os Joaseirenses ainda passavam as noites sentados em cadeiras de balanço nas calçadas, conversando. Eu morava no Colégio Salesiano, onde passava os dias copiando os arquivos de Padre Cícero, e minha mulher e meus dois filhos encontraram um porto seguro no quarto de hóspedes de um convento de freiras, que não hesitaram em se tornar "tias" das crianças. Em cada roda de conversa nas calçadas eu aprendia mais sobre a cidade e seu passado. Por exemplo, foi ali que aprendi pela primeira vez sobre a clivagem histórica entre os “filhos da terra” e os “forasteiros”. Ou sobre a eterna luta dos nativos para se tornar prefeito. Eu poderia continuar, mas, resumindo, esta é a história de um historiador que se tornou antropólogo, apesar de si mesmo.

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