“Em algum lugar no mundo,
talvez no Brasil, existe um homem feliz”, os versos de Vladimir Maiakovski bem
que se podem aplicar a Erasmo Carlos, o eterno roqueiro brasileiro, que traz
sua turnê de 50 anos de carreira para o Baile Perfumado, sábado, dia 4 de maio.
Ele começa a entrevista, por telefone, exultante: “Os shows têm sido um
sucesso, o pessoal tem mostrado um imenso carinho por mim. Eu sou muito querido
no Brasil todo, em todas classes sociais”.
Aos 72 anos, ele se apresenta com Os Filhos de Judith, banda
formada por músicos com média de idade de 28 anos: “Rola uma troca de
informações entre a gente. Pra eles é bom porque queimam etapas. Estivemos no
Rock in Rio, em Lisboa, tocaram comigo no Theatro Municipal, no Rio, passei 50
anos para conseguir isso”, comenta o Tremendão da Jovem Guarda.
Este ano ele completa meio século de parceria com Roberto
Carlos, iniciada com Parei na contramão (só lançada no ano seguinte), com uma
letra hoje impensável em tempos de politicamente correto, a começar pelo
título: “Fizemos muitas músicas politicamente incorretas. Não dava para fazer
nos dias atuais uma É proibido fumar”, concorda Erasmo, fumante inveterado, que
por isso mesmo cada vez vai menos a bares e restaurantes:
“Eu fumo muito, mas em casa, já que não se pode mais fumar em
canto algum. Ora, se o cigarro faz mal porque permitem que se fabrique e seja
vendido? Claro, o governo não quer perder o que ganha de imposto das fábricas
de cigarro”.
É por isso também, que prefere ônibus a viajar de avião: “Avião
tem muito contratempo. Espera em aeroporto, a humilhação da revista, tudo bem é
necessário, mas é humilhante. Às vezes viajamos dois dias para fazer um show de
duas horas e meia. Em ônibus a gente vai conhecendo as pessoas, o Brasil é
fascinante”, diz o cantor que, no auge da Jovem Guarda, comprou um Rolls-Royce (que
pertenceu ao então Governador de São Paulo, Adhemar de Barros, o do “rouba mas
faz”).
Comprou porque John Lennon tinha um. Esta é uma das poucas
influências dos Beatles na sua obra: “Elvis, Chuck Berry, Little Richard, esses
foram os caras que me influenciaram, que eu ouvia na adolescência. Surgimos
quando os Beatles surgiram, sofremos as mesmas influências, somos
contemporâneos”, diz Erasmo, que firmou a amizade com Roberto, em 1959, quando
ele o procurou para aprender letras de rock, que cantaria na abertura de um
show de Bill Halley and His Comets, no Rio.
SEXO
Com os Beatles ele comunga das canções de letras ingênuas do
começo de carreira: “Tinha muita música boba, ridículas, mas tinham a ver com
meu tempo. Hoje eu não faria uma Fama de mau. Ela continua nos shows porque faz
parte de uma época, mas não é a minha realidade. Mas as músicas têm muito de
sexo também. Naquela época eu cantava eu beijo, beijo, beijo, porque não podia
cantar eu fodo, fodo, fodo. Mas era isso o que significava a letra”, diz Erasmo
Carlos.
Ele ri quando é lembrado de uma, assinada por
ele e Roberto Carlos, Um quilo de doce, gravada por Wanderléa (Comprei um quilo
de doce/pensando que você fosse/me dizer com emoção, que é meu o seu coração):
“Um quilo de doce com fosse era pra rimar, bicho. Tinha uma de Chuck Berry,
Memphis Tennessee, que Wanderléa cantava e virou não sei o que o rapaz do
Piauí” (Sem endereço, versão de Rossini Pinto).
Seus dois últimos discos chamam-se Rock and roll e Sexo, o que
aponta para uma trilogia terminada com Droga. O que seria natural para quem
escreveu uma canção chamada Maria Joana, cujos versos finais não poderiam ser
mais sugestivos: “Eu sei (eu sei)/que na vida tudo passa/o amor (o amor)/vem
como nuvem de fumaça (fumaça).
Ninguém espere ouvir Maria Joana no show de 50 anos de carreira
do Tremendão: “Não canto mais, até por bom senso. Era legal para a realidade da
época, mas uma realidade importada. Sexo, drogas, e rock and roll era uma coisa
dos Rolling Stones, era moda, mas os tempos mudaram. Quantos amigos perdi por
causa de drogas?”
Mais presente em seu rock
and roll está o sexo, quase explícito feito no recente álbum homônimo, ou
sutilmente implícito no passado. em músicas como Fantasias (2003): “É sobre
masturbação. Na letra eu posso ter a mulher que quiser, é só fechar os olhos”,
confessa ele sem hesitar.
ROCK
Um dos pais do rock brasileiro, Erasmo Carlos sofreu uma de suas
maiores decepções, em 1985, exatamente no primeiro megafestival de rock
realizado no país, o Rock in Rio. Falta de senso, ou de conhecimento do
assunto, a produção do festival colocou Eramos Carlos na noite em que a Cidade
do Roco foi tomada por camisas pretas para assistir ao Iron Maiden,
Whitensnake, e o Queen, numa época em que atrações internacionais deste porte
eram raras no Brasil.
O Tremendão foi vaiado, praticamente enxotado do palco pelos
headbangers: "Isto aí foi coisa de época. Ninguém ainda sabia que existiam
tribos diferentes. Sempre fui um sonhador, pra mim música é do bem. Música e
orgasmo são as duas coisas que aproximam a gente de Deus. Então eu pensava que
em música não existiam tribos, misturaram artistas e deu naquilo".
Com meio
século de palco, e se apresentando sempre para casas cheias, como acontece com
os contemporâneos Pal McCartney ou The Rolling Stones. Na opinião dele isto se
deve a não ter surgido, há anos, nada de novo sob o sol da música popular:
"Acho que o que tinha que ser feito já feito. Só resta adaptar, até na
poesia falar de amor ficou difícil. Antigamente não se tinha vergonha de rimar
amor com dor. Hoje se procura fugir do que é convencional, tudo bem, mas
ninguém deve se policiar. Não sei se vai aparecer um outro Beatles. Pode ser.
Mss terá que ser algo totalmente diferente do estabelecido. O novo mesmo, com
outra estética".
José Teles
JC
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