sábado, 27 de abril de 2013

Música: Doméstica: como a MPB tem tratado o tema ao longo dos anos

Nos anos 60 elas eram tratadas de maneira pejorativa
O cantor goiano Odair José, em 1973, foi pioneiro em denunciar a discriminação sofrida pelas empregadas domésticas. Em Deixe essa vergonha de lado, canta o drama de uma moça que faz de tudo para que o namorado não saiba que ela trabalha em casa de família. Ele não se importa com a profissão que ela exerce, o amor é mais forte do que preconceitos, assegura no antológico refrão: “Deixe esta vergonha de lado/nada disso tem valor/por você ser uma simples empregada/não vai modificar o meu amor”. Uma revigorante dose de autoestima para as domésticas, até então presentes na música popular quase sempre de forma pejorativa, ou resvalando para o humor de gosto duvidoso.


Dez anos antes, por exemplo, Roberto Silva, O Príncipe do Samba, gravou uma música na qual o tema abordado é praticamente o mesmo de Deixe esta vergonha de lado. Só que a moça que tenta esconder que é doméstica é desmascarada. O samba (de (Sebastião Neves, Luiz C. Vieira e Neidir Figueirôa), chama-se Chofer de fogão. Assim como o título, os versos são impensáveis em tempos de politicamente correto: “De blusa e decote/e até de capote/ela vai à cidade/diz a todo mundo/que ela faz parte da sociedade/o azar penetrou, a história acabou/era tudo ilusão/e agora todos sabem/que ela é chofer de fogão”.

O tema é recorrente na música popular brasileira, em crônicas que espelham o comportamento da sociedade em relação às empregadas doméstica. Jackson do Pandeiro, em 1955, fez sucesso com Falsa patroa (Geraldo Jacques/Isaías de Freitas). A letra conta a história de um sujeito que foi em cana ao ser flagrado na casa do delegado. A culpa? Da empregada, por quem alega ter sido ludibriado: “Doutor delegado, eu não tive culpa/foi a sua criada que me convidou/doutor dizendo que o apartamento era dela/me pegou pelo braço para jantar com ela/o senhor compreende, viu doutor/a cabrocha é boa/eu fiquei iludido pensando que ela fosse a patroa”.


 Em 1963, o hoje esquecido Silvinho, imensamente popular no começo dos anos 60, especialista em bolerões passionais, emplacou um grande sucesso com Mulher governanta (Getúlio Macedo), em cuja letra deplora o marido que trata mal a legítima esposa. No final da diatribe contra o cônjuge ingrato, arremata: “Amigo, essa mulher mal amada/ela é a sua esposa/ não é a sua empregada”
A MPB se redimiu graças a Odair José. Depois de Deixe esta vergonha de lado, o jogo virou para as empregadas domésticas: “Uma empregadas também ama de verdade/Uma empregada também tem um coração/ Quando se ama a profissão não interessa/ O que interessa é amar com devoção” , cantou o baiano Waldick Soriano, em Uma empregada vai ser mãe dos meus filhos (com Júlio César). 
O sertanejo Sérgio Reis também canta a igualdade em O doutor e a empregada, em que o filho da patroa une-se, pelos laços do matrimônio, à empregada de sua casa. A lista é longa, mas quase todas antigas. O tema está fora de moda. Em outros tempos, o PEC das domésticas renderia no mínimo uma marchinha carnavalesca, ou um frevo-canção.

José Teles

JC

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