Há 11 anos morria o poeta José Antônio do Nascimento Filho, o Zeto do
Pajeú, que ganhou fama quando, depois do golpe de 64, Miguel Arraes voltou ao
Brasil e venceu as eleições para governador de Pernambuco, em 1986.
O protesto contra os militares que destituíram e exilaram Arraes ecoou na
voz e na viola de Zeto: “Volta Arraes ao Palácio das Princesas, vai entrar pela
porta que saiu”. Esses versos foram repetidos inúmeras vezes do Sertão ao cais
e se tornaram o símbolo do retorno de Arraes à cadeira de governador.
Zeto nasceu em Canhotinho, no Agreste. Aos cinco anos se mudou com a
família para Caruaru e na adolescência veio para o Recife. Em abril de 1986,
durante uma viagem a São Paulo para participar de um congresso do Partido
Comunista, conheceu a cantora Bia Marinho.
Ela lhe abriu não só o coração, mas também o caminho do Pajeú e da fama.
Em poucos dias de namoro, se apaixonaram. Foram morar juntos em São José do
Egito, terra do pai dela, Louro do Pajeú, e surgiu a gravidez do primogênito,
Antônio Marinho – que seguiu a trilha poética do pai.
Para seguir uma tradição sertaneja, o casal combinou que Zeto teria que
pedir ao pai dela a permissão para o casamento.Sentados em círculo na sala da
casa da família de Bia, Zeto abriu o discurso. Mas de nada adiantaram os
ensaios.
Cada vez se enrolava mais e não saia nada compreensível. Bia interveio:
“Pai, ele quer pedir minha mão”. Louro do Pajeú, poeta maior da região, com
aquela sabedoria secular do sertanejo, olhou para o pretendente e disparou com
um sotaque nordestino bem carregado: “É só o que falta ela te dar”.
A família caiu na gargalhada e começava ali uma longa história de amizade
entre os dois poetas. A primeira doação do sogro ao genro, além do verso da volta
de Arraes, foi o sobrenome. A partir de São José do Egito, passou a ser chamado
de Zeto do Pajeú.
Apaixonado por poesia e por música, logo se adaptou à nova moradia, que
já era conhecida como a terra dos poetas. Religioso, costumava rezar e ir á
missa todos os domingos.
Pai zeloso, acordava com o dia ainda escuro para preparar as refeições da
família e levar os três filhos à escola (Antônio, Miguel e o enteado Greg). Na
música, apreciava os cantores regionais, mas não deixava também de curtir
Caetano, Jorge Mautner, Gil, Vicente Celestino – Zeto interpretava com maestria
o Ébrio.
Na poesia, conhecia e gostava dos versos de poetas como Baudelaire,
Fernando Pessoa e Augusto dos Anjos. Na esteira do poeta paraibano, também
deixou uma única obra, o CD Curvas, gravado em apenas quatro horas, sem
intervalo, num estúdio do Poço da Panela, no Recife.
Na gravação, Zeto conversa, afina o violão, declama e canta. Há pouco
tempo, Yamandu Costa fez uma revelação: “Na hora de cozinhar, gosto de ouvir o
disco de Zeto”.
Às quatro horas da tarde do dia 14 de outubro de 2002, aos 46 anos, o
poeta, que era como costumava chamar todo mundo, deu seu último suspiro e
partiu para a eternidade.
No seu enterro, em Canhotinho, tendo como testemunhas parentes, amigos,
filhos, poetas e bêbados, o filho Antônio Marinho declamou versos de Augusto
dos Anjos e a companheira Bia Marinho foi buscar nos versos de Vinicius de
Moraes a senha para a despedida:
“Eu sei que vou te amar, por toda a minha vida eu vou te amar, a cada despedida
eu vou te amar….”. Terminava assim, de forma precoce, a história de um homem
que dedicou toda a sua vida à música e à poesia.
*Jornalista
* Ítalo Rocha Leitão
Blog do Magno
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