Rodeada de cercas e currais
Acordava escutando os sabiás
Festejando a aurora na campina
Com o leite do peito da turina
Minha mãe completava a refeição
Ajudava meu pai na plantação
Me orgulhava do cabo da enxada
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Fazer conta ser ter com que pagar
Muitas noites saía pra caçar
Não achava nem peba no buraco
Se trouxesse um sibito no bisaco
Mãe assava nas brasas do fogão
Dividia comigo e meu irmão
Dava graças a Deus pela caçada
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Quando tinha sinais de inverno bom
O motor do trovão subia o som
Que tremia o painel do nevoeiro
A orquestra dos sapos no barreiro
Aumentava o volume da canção
Deus ligava o piano do carão
E a cigarra ficava aposentada
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Me banhando com água da goteira
Vendo pai cortar unha de peixeira
Mãe num caco, torrando tanajura
Meu café foi com cinza e rapadura
Meu arroz foi de fundo de pilão
Meu Viagra foi graxa de pirão
Leite quente, cuscuz e carne assada
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Fiz aceiro de broca e de coivara
Teci cerca de arame, ramo e vara
Roubei santo na seca pra chover
Com dez anos de idade por não ter
Um bigode eu pintava de carvão
Pra dançar as quadrilhas de São João
Era mãe que escolhia a namorada
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Mas criei-me no meio da fartura
Alfenim, mel de engenho e rapadura
Lá em casa sobrava todo dia
No período junino a gente ia
Assistir à subida do balão
Acender a fogueira de São João
Ver forró pé de serra na latada
Minha alma matuta foi gerada
Nas entranhas do ventre do sertão.
Um das grandes relíquias deixadas pelo mestre Valdir Teles.
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