"Mazzaropi" (2013), estreia do diretor Celso Sabadin, explora um dos nomes mais populares do cinema nacional
O que é ser caipira? Este é o ponto de partida do documentário "Mazzaropi", de Celso Sabadin. Entre os convidados para participar dessa e de outras discussões estão o cantor e compositor Renato Teixeira, o apresentador Ratinho, o cantor Daniel, o crítico de cinema Inácio Araújo, a cantora e apresentadora Hebe Camargo, o cantor Ronnie Von, o humorista Ary Toledo, a atriz Selma Egrei, o cineasta e crítico Alfredo Sterheim, o cantor Agnaldo Rayol, o crítico de cinema Gustavo Dahl, o ator David Cardoso, entre outros.
Começar pela discussão do que é ser caipira é bastante pertinente, pois remete à separação que existe entre as classes mais aristocráticas e as mais populares, que eram as que prestigiavam os filmes de Amácio Mazzaropi, que faziam cada estreia de um filme novo seu um acontecimento de interditar ruas com multidões.
O próprio Inácio Araújo é um dos críticos que reconhece que não via muita graça nos filmes de Mazzaropi, excessivamente simples e um tanto desleixados, inclusive nos aspectos técnicos. Mazzaropi, que era ator e produtor de seus próprios trabalhos, não ligava muito para a qualidade do som, por exemplo. Renato Teixeira, ao falar do preconceito existente com a figura do caipira, falou que quem foi responsável por diminuir esse preconceito no país foi Elis Regina, ao gravar "Romaria", até então só cantada por cantores sertanejos. Curiosamente, o Jeca Tatu, personagem de Monteiro Lobato incorporado por Mazzaropi, não passava da caricatura do caipira. No entanto, o público sertanejo gostava, não se sentia ofendido, ria das piadas do personagem.
Público
Uma das coisas que o documentário destaca é o pensamento de Mazzaropi com relação à recepção do público. Para ele, não importava a crítica. Quem ia pagar os seus filmes era o público. E por isso ele nunca deixou de se apresentar em circos.
O circo era um meio de ele testar as piadas. Se elas funcionassem no picadeiro, podiam muito bem funcionar nas telas. Não deixa de ser uma maneira inteligente de lidar com sua própria arte e com os negócios. Diferente de muitos artistas que não sabiam lidar com dinheiro, Mazzaropi sabia muito bem e administrava tudo a rédeas curtas, a ponto de ser considerado "pão duro" por muitos artistas e técnicos que trabalharam com ele.
Outro detalhe interessante do documentário de Sabadin é a entrevista nas ruas. "Quem é Mazzaropi?", "Você conhece Mazzaropi?" são as perguntas feitas para anônimos. A maioria não conhece ou já ouviu falar mas nunca viu nenhum filme ou lembra que seus pais já viram.
Por outro lado, nas banquinhas que vendem DVDs, os filmes do Mazzaropi continuam vendendo bem. Apesar de, atualmente, não ser mais tão popular, os trabalhos do humorista ainda são itens procurados. Sabadin, em sua estreia na direção, não chega a fazer um documentário inovador. O que vemos é uma estrutura tradicional, com base principalmente nos depoimentos dos convidados, que costuram uma narrativa que conta desde os primeiros passos de Mazzaropi no teatro, no rádio e na televisão (dos anos 1930 à década de 1950), passando por sua estreia no cinema; e que explora o quanto o cinema se tornou seu principal veículo de comunicação com as plateias (de meados de 1950 a 1970), quando seu estilo de humor já estava popularizado e azeitado para as audiências.
Porém, mesmo com essa estrutura tradicional, "Mazzaropi" é um documentário muito bom e deliciosamente informativo, que poderia ter tido uma boa carreira nos cinemas, mas a distribuidora optou por lançar direto em vídeo. Não deixa de ser uma decisão de certa forma prudente, já que até um documentário sobre um artista tão popular quanto Raul Seixas fracassou nas bilheterias. Sinal de que documentários só são bem-sucedidos no circuito alternativo mesmo.
Por isso, o lançamento direto em DVD, ainda que diminua a visibilidade do filme, é mais do que bem-vindo, e certamente agradará a quem se permitir conhecer um pouco mais sobre esse sujeito único que foi Amácio Mazzaropi.
FIQUE POR DENTRO
Amácio, artista de circo, teatro, cinema e TV
Filho de Bernardo Mazzaropi, imigrante italiano e Clara Ferreira, portuguesa, o pequeno Amácio Mazzaropi foi criado no interior de São Paulo, entre Taubaté e Tremembé, principalmente com o avô materno, João José Ferreira, tocador de viola. Com catorze anos, já tendo morado na capital com sua família, Mazzaropi retorna a São Paulo, onde finalmente ingressa na caravana do Circo La Paz. Nos intervalos do número do faquir, Mazzaropi conta anedotas e causos. Sem poder se manter sozinho, no entanto, em 1929, Mazzaropi volta a morar em Taubaté com os pais, onde começa a trabalhar como tecelão. Nos anos de 1930, estrearia sua primeira peça de teatro, "A herança do Padre João". Em 1935, convence seus pais a seguir turnê com a "Troupe Mazzoropi", que percorre municípios do interior paulista. A estreia no cinema acontece na década de 1950, com "Sai da Frente" (1952). Daquele ano em diante, não para mais. Até 1958 já tinha gravado outros cinco filmes. Nesse mesmo ano, vende sua própria casa e inaugura a PAM Filmes (Produções Amácio Mazzaropi). Filmou 32 produções até o fim da vida. Seu 33º filme, Maria Tomba Homem, nunca seria terminado. Depois de 26 dias internado, Mazzaropi morre, vítima de um câncer na medula óssea aos 69 anos de idade.
Da equipe do Blog de cinema
AÍLTON MONTEIRO*
ESPECIAL PARA O CADERNO 3
DIARIO DO NORDESTE
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