Prestes a lançar o CD e DVD "Zeca
Pagodinho 30 Anos, Vida que Segue", que celebra três décadas de carreira,
Zeca recebeu a imprensa em um hotel na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, para
contar detalhes da produção do trabalho. Gravado em dois shows em 4 e 5 de
dezembro do ano passado, o lançamento, em vez de fazer um apanhado da
trajetória do artista, como era de se imaginar, reúne grandes sambas do
passado, de autores que o influenciaram.
A
lista de homenageados inclui Candeia ("Preciso Me Encontrar"), Zé Kéti
e Elton Medeiros ("Mascarada"), Paulinho da Viola ("Foi Um Rio
Que Passou Em Minha Vida") e Adoniran Barbosa ("Trem das Onze"),
entre outros. O material será lançado no dia 23 de maio.
Também
compila clássicos como "Aquarela Brasileira" (Silas de Oliveira"),
"Volta Por Cima" (Paulo Vanzolini) e "Quem Parte Leva
Saudade" (Francisco Scarambone). De quebra, o CD e DVD conta com a
participação de convidados como Paulinho da Viola, Marisa Monte, Velha Guarda
da Portela, Yamandú Costa, Hamilton de Holanda, Roberto Menescal e
outros.
A
escolha dos convidados, segundo o próprio Zeca Pagodinho, foi natural, por
afinidade. "Eu mesmo convidei a Marisa, o Paulinho... Já o Leandro
Sapucahy eu encontrei no shopping. Como eu gosto dele, o convidei para gravar
comigo. Ele representa bem a juventude, a geração dele", elogiou.
A
única faixa inédita no trabalho é "É Vida Que Segue (Por que Não?)",
de Serginho Meriti, Rodrigo Leite e Cocão. A música, que não estava prevista
para ser incluída, mas acabou batizando o lançamento, foi gravada em forma de
clipe com a participação de Xuxa e do coro dos alunos da Escola de Música do
Instituto Zeca Pagodinho.
"Essa
música não tinha a ver com o projeto, mas ela me tocou e tocou quem a ouviu.
Quando o Serginho cantou a música todo mundo parou, e eu decidi que iria
gravá-la com as crianças de Xerém", conta o cantor.
Com
30 anos de estrada, Pagodinho acredita que tenha se tornado uma referência no
meio do samba porque sempre procurou fazer o melhor e trabalhar com os
melhores. Um exemplo disso é o próprio projeto que comemora esses 30 anos. Em
vez de rearranjar antigos sucessos seus, o artista preferiu citar suas
referências musicais e apresentar essa herança às novas gerações.
"Quem
viveu essa época, vai lembrar e gostar. E quem não viveu, vai conhecer. A gente
procurou fazer os arranjos como eles eram. A opção por esse repertório é porque
foi onde eu comecei, é sobre a minha paixão pelo samba, pela música brasileira.
A partir daí, a vida me levou e fez de mim um artista", justifica.
Uma
outra paixão talvez explique a escolha por esse repertório que remete a uma
outra época, mais romântica, do samba e da música brasileira em geral: a
admiração pela Velha Guarda. Em especial, a da Portela, sua escola de coração.
Os encontros com antigos sambistas não apenas moldaram a música e o caráter de
Zeca Pagodinho, como foram seu passaporte para o meio artístico.
"Quando
a gente os vê cantando, eles têm uma organização que é só deles. Os violões, o
cavaquinho, o jeito de cantar... Há um respeito, uma coisa meio mística. É uma
preciosidade. E eu comecei no primeiro Terreiro da Portela, na casa da Tia
Doca, onde mostrei meus primeiros trabalhos. O samba era tocado baixo, a gente
ouvia o cantor. Às vezes, eles deixavam a gente cantar uma música, porque nossa
batida era diferente, e eles torciam o nariz", recorda.
Bem-humorado,
como de costume, Zeca Pagodinho admitiu que, no repertório com 19 músicas que
compõe o CD e DVD, uma lhe deu mais trabalho do que ele imaginava:
"Mascarada". Ainda assim, e apesar dos apelos da família, ele
enfrentou o desafio e conseguiu decorar a letra e achar a forma ideal de
interpretar a canção.
"A
gente cantava essa música em casa quando eu era garoto, mas de algumas partes
eu não lembrava mais. Meu medo era errar em um show para a imprensa e
convidados. Ouvi a música umas 500 mil vezes. Ninguém lá em casa aguentava
mais. Mas eu encarei e gravei de primeira", orgulha-se.
O
bom humor virou piada, definitivamente, quando o cantor foi perguntado sobre o
que ele lembra, quando coloca a cabeça no travesseiro, sobre esses 30 anos de
carreira e os muitos altos e baixos de uma trajetória musical. "Quando eu
boto a cabeça no travesseiro há muitos altos e baixos porque eu bebo muito
durante o dia."
Outro
momento divertido do bate-papo foi quando Pagodinho foi questionado sobre se
aceitaria participar da abertura dos Jogos Olímpicos, caso fosse convidado.
Eterno malandro, o artista não perdeu a oportunidade. "Com essa pinta de
atleta? Olimpíada de quê? Essa foi do c…! Ta maluco?! A bola está aqui na
barriga!."
Mas
quem é bom sabe fazer piada e sabe falar sério. Cidadão engajado e um
apaixonado declarado pela localidade de Xerém, na Baixada Fluminense, Zeca
lamenta que, a despeito das últimas enchentes que colocaram, de forma negativa,
a região na mídia, nada tem sido feito pelo poder público para mudar a
situação.
"Lá
já não tinha nada. Agora tem nada menos 50. Vejo o mínimo ser feito por lá.
Continua tudo do mesmo jeito, improvisado, com ponte quase caindo, ponte
quebrada... O Governo Federal diz que a responsabilidade é do Estadual, que diz
que é do Municipal, que diz que é do Federal. O que eu sei é que tem gente
ficando rica às custas da tragédia dos outros."
Depois
do desabafo, Pagodinho voltou a descontrair o ambiente ao pedir água, algo raro
para um notório cervejeiro. Mas o cantor se saiu bem ao justificar o pedido.
"É só hoje, porque eu estou com um problema na garganta. Fico até
constrangido. Mas se o meu médico bobear, daqui a pouco eu vou abrir uma ali
escondido".
Para
os próximos 30 anos, Zeca Pagodinho diz que deixa nas mãos de Deus, mas que
pretende continuar tomando sua cerveja e cantando samba. De preferência, ao
lado dos velhos amigos com quem costuma dividir o palco em suas apresentações.
"Eu os conheci no morro, no botequim, e não no palco. Na hora de tocar,
tem que tocar, não pode jogar água pra fora da bacia. Mas, fora do palco, é
tudo compadre."
Alexandre Coelho
Do UOL, no Rio de Janeiro
Nenhum comentário:
Postar um comentário