Em 1968, Ronnie Von jogou para o alto sua imagem de Pequeno Príncipe e bom moço para colocar o decisivo riff distorcido na psicodelia tupiniquim. Os primeiros passos haviam sido dados por ele mesmo em “Ronnie Von 3” (1967), com Caetano Veloso e Os Mutantes - estes, aliás, batizados pelo próprio Ronnie quando tocavam no programa que ele apresentava na Rede Record, “O pequeno mundo de Ronnie Von”. No final da década de 1960, o cantor lançou o LP “Ronie Von”, reiniciando a contagem de seus discos como se estivesse recomeçando dali sua carreira. A primeira faixa, “Meu novo cantar”, deixava isso bastante claro: “Doa a quem doer/ Então eu vou cantar/ Meu canto é pra valer/ Meu canto é pra mudar”.
A mudança não
durou tanto tempo assim. Em “Ronnie Von” (1972), por pressão da indústria
fonográfica, descontente com o resultado de tamanha transgressão na venda de
discos do galã, ele retomou suas canções românticas e populares - não sem
arranjar um jeito de impor sua personalidade com “Cavaleiro de Aruanda”, tema
de umbanda composto por Tony Osanah incluída no repertório. Contudo, três anos
foram o bastante para deixar como legado um dos tesouros da música nacional, a
trilogia psicodélica composta por “Ronnie Von” (1969), “A misteriosa luta do
Reino de Parassempre contra o Império de Nuncamais” (1969) e “A máquina
voadora” (1970).
Para comemorar
o Dia do Vinil (20 de abril), finalmente a trinca cultuada será relançada pela
Polysom, este mês, em versão 180 gramas com som remasterizado das fitas
originais de gravação da época. O projeto faz parte do projeto “Clássicos em
Vinil”, que busca resgatar discos marcantes da história fonográfica brasileira
e relançá-los. Álbuns como “Secos & Molhados” (de Secos & Molhados),
“Cabeça Dinossauro” (Titãs) e “Nós Vamos Invadir Sua Praia” (Ultraje a Rigor)
já passaram por esse processo.
A trilogia
psicodélica é o ponto alto da carreira de Ronnie Von. “Tudo o que fiz depois
não foi tão interessante. Quando deixei de experimentar, me violentei
musicalmente”, chegou a comentar o músico em entrevista dada à revista Época,
em 2010. Em 2006, a Universal já havia reeditado “Ronnie Von” e “A máquina
voadora” em CD, mas “A misteriosa luta...” ficou de fora. Em lojas de
colecionadores, o CD podia ser encontrado por cerca de R$ 60. Segundo Ronnie Von,
o vinil estava sendo vendido por quase US$ 1500 em um estabelecimento no Japão.
Fã dos discos
dos Beatles que o pai trazia para ele do exterior, o príncipe de olhos claros
ficou encantado pelo psicodelismo dos ingleses e decidiu que aquele era o tipo
de som que queria fazer. Com músicas como “Espelhos quebrados” e “Silvia: 20
horas no domingo”, o álbum que ele lançou pela Polydor em 1969, produzido por
Arnaldo Saccomani, é puro experimentalismo,.
Obviamente, tanta psicodelia não foi bem vista pela mídia, fãs, nem pela gravadora, que julgou o trabalho pouco comercial. Mas o principal problema que Ronnie Von teve foi com a família. O pai achava que aquele tipo de música era coisa de jovens rebeldes, drogados e transviados e expulsou o filho de casa.
Obviamente, tanta psicodelia não foi bem vista pela mídia, fãs, nem pela gravadora, que julgou o trabalho pouco comercial. Mas o principal problema que Ronnie Von teve foi com a família. O pai achava que aquele tipo de música era coisa de jovens rebeldes, drogados e transviados e expulsou o filho de casa.
Ainda bem que
o cantor não se deu por vencido e lançou outra pérola. Feito sob a supervisão
de André Midani, presidente da gravadora, “A misteriosa luta...” é mais
conceitual e tem um som maduro, com toques progressivos. O disco traz viagens
sensoriais em faixas como “De como meu herói Flash Gordon irá levar-me de volta
a Alfa Centauri” e “Atlântida”. Outras como “Regina e o mar” e “Mares de areia”
lembram bastante o que seria feito no udigrúdi pernambucano, em temática e
sonoridade.
Contudo, o
destaque fica mesmo para as versões. A ousada releitura de “Dindi” (Tom Jobim)
é uma das melhores já feitas. “Comecei uma brincadeira” (“I started a joke”,
Bee Gees) consegue superar a original.
“A máquina
voadora”, embora tenha algumas composições interessantíssimas como a que dá
nome ao disco e “Imagem”, é um pouco mais contido e denuncia que o romantismo
voltaria a imperar. Ronnie, que queria transformar os quadros de René Magritte
e Salvador Dalí em canção, foi obrigado a cantar para obter suspiros, não
transes. Mas sua música contribuiu para que a caretice olhasse com olhos mais
simpáticos para os psicodélicos, que ganharam espaço. A tropicália entrou nos
lares brasileiros. A tríade psicodélica de Von significa.
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