quarta-feira, 20 de março de 2013

MÚSICA / LUTO: Xexéo sobre Emílio Santiago: timbre único e afinação perfeita

 'Rara voz masculina num país de cantoras. Num tempo em que a vulgaridade ganha destaque, era elegante'

RIO - No Brasil de Gal, Elis, Bethânia, Nara, Elba, Alcione, Fafá, Nana e Simone, havia um Emílio. Rara voz masculina a se destacar num país de cantoras, Emílio Santiago teve uma trajetória típica dos artistas de sua geração. Participou de programas de calouros — chegou à final de “A grande chance”, de Flavio Cavalcanti, uma espécie de “The voice” dos anos 60 do século passado —, foi crooner de orquestra — era o responsável por muito do balanço do grupo de Ed Lincoln — e cantou em piano-bares — animava as noites do Number One, uma boate que fez História na boemia carioca. Como resultado, Emílio ganhou a principal característica de sua arte: a versatilidade.

Sua carreira ficou marcada pela série de sete discos “Aquarela brasileira”, que gravou na Som Livre nos anos 1980 e 90. Ali, está o melhor do repertório nacional, sambas-enredos, sambas-exaltação, clássicos de Dorival Caymmi a Cartola. Vendeu seis milhões de cópias. Houve um tempo em que o “Aquarela brasileira” do ano era o presente mais distribuído nos encontros de amigo oculto na época do Natal. Mas isso foi na época em que ainda se vendia disco e um CD ainda era presente de Natal.
Emílio teve uma legião de seguidores fiéis. Os sambas das “Aquarelas” eram regravações. Mas também teve seus lançamentos de sucesso, como “Pelo amor de Deus”, de Paulo Debétio e Paulinho Rezende, e “Saigon”, de Claudio Cartier, Paulo Feital e Carlão. As duas canções eram uma espécie de assinatura de Emílio. Daquelas que quando começava a cantar num show , o público inteiro fazia coro.
Além de talentoso, dono de um poderio vocal evidente, de um timbre único e de uma afinação perfeita, Emílio era, acima de tudo, um boa praça. Numa época em que a arte se mistura com exposição, era discreto. Num tempo em que a vulgaridade ganha destaque, era elegante. Numa indústria em que a música se confunde com obscenidade, manteve o bom gosto. Pode-se discutir quem é o maior cantor do Brasil. Ed Motta, dono de outro vozeirão, não tem dúvidas: “Emílio foi o maior cantor desse país”. Eu concordo com Ed Motta. Mas o sentimento que me chega agora é o mesmo exposto por Fafá de Belém nas redes sociais: “Que merda! Emílio partiu

ARTUR XEXÉO
o gLOBO

Nenhum comentário:

Postar um comentário